Existe "Dia da Consciência Branca"? Entenda por que não faz sentido - Purebreak

|

Your browser doesn't support HTML5 video

Veja as fotos!
Entenda por que não faz sentido um 'Dia da Consciência Branca'
O Dia da Consciência Negra tem como objetivo não deixar a história do povo negro ser esquecida e, para isso, celebramos a existência dessa raça que foi tão violentada e excluída ao longo da história. Mas parece que temos muito o que avançar na luta antirracista, já que muitas pessoas brancas não acham importante racializar questões e preferem colocar a sujeira do nosso passado para debaixo do tapete. Precisamos entender por que isso é errado e o motivo de um "Dia da Consciência Branca" não fazer sentido algum.

O Dia da Consciência Negra foi celebrado no último sábado (20), momento em que muitas empresas, órgãos e a sociedade civil usam para exaltar a história das pessoas negras no Brasil e nos lembrarem que temos muito o que lutar para atingir uma sociedade com igualdade e justiça. No entanto, até hoje muitos brancos ainda não entendem o verdadeiro significado e importância da data, como Regina Duarte. A atriz e ex-secretária de Cultura do Governo Bolsonaro achou importante falar o que pensa sobre o Dia da Consciência Negra por meio do seu Instagram, promovendo uma grande polêmica.

Regina Duarte questiona o Dia da Consciência Negra

Em um post compartilhando um vídeo em que o ator Morgan Freeman fala sobre a data não ser o suficiente para condensar a história do povo negro, Duarte questiona: "Quando teremos o Dia da Consciência Branca, Amarela, Parda...? Quanto tempo vamos ainda nos vitimizar ao peso de anos, de séculos de dor por culpas antepassadas? Quando vamos parar de olhar pra trás e enfrentar o hoje e nós olharmos com a coragem da cara limpa? Maduros, evoluídos, conscientes de nossa luta, irmanados em nossa capacidade, de sermos... HUMANOS? Simplesmente IRMÃOS?".

O posicionamento problemático da celebridade deu o que falar, já que muites ficaram incomodades com o questionamento racista transvestido de solidário da artista que visivelmente não se importou em pesquisar o sentido da data em nenhum momento. Por isso, o Purebreak te explica o porquê da existência de um "Dia da Consciência Branca" não fazer sentido.

Entenda a história do Dia da Consciência Negra

Primeiramente, é importante reforçar a simbologia por trás do Dia da Consciência Negra. A data é celebrada em 20 de novembro por recordar o dia da morte de Zumbi dos Palmares, assassinado em 20 de novembro de 1695. Zumbi foi o último dos líderes do Quilombo de Palmares, um lugar que abrigava escravizados e ajudou a construir um importante movimento de resistência à escravidão.

Anos depois, já em 1971, o Grupo Palmares - um coletivo criado em 1971 para refletir sobre a situação das pessoas negras no Brasil e mudar essa realidade - achou importante criar um dia para celebrar a grande importância da cultura negra no Brasil. Por isso, nada mais justo que fazer uma homenagem a um dos maiores nomes para o Movimento Negro do nosso país.

A história des branques é diferente da história des negres

Justamente por não ter nenhuma história similar à situação das pessoas brancas no Brasil uma data celebrando a Consciência dessa raça não deveria existir. É importante que Regina Duarte aprenda que os três séculos de escravidão de uma raça inteira não é vitimismo. Vitimismo é usufruirmos de todos os benefícios trazidos pela cor da nossa pele graças a antepassades e fingirmos não ter vantagem sobre outras etnias. E claro, tudo isso enquanto nos posicionamos de forma cínica, de modo a fingir que o racismo não existe e não é o maior problema da nossa sociedade.

Pessoas brancas fingem que são oprimidas por pessoas negras

Falando de tudo isso, faz sentido trazer à tona o conceito de máscara usada pela autora Grada Kilomba para se referir a um dos vários mecanismos do racismo. Para ela, aquele instrumento de reprimir escravizados por meio da limitação da boca persistiu de forma simbólica na nossa sociedade até os dias de hoje. Atualmente, es branques utilizariam dessa ferramenta - de forma explícita ou não - para silenciar conhecimento, vivências e dores de pessoas negras.

Além disso, a máscara seria uma ilustração do suposto medo des branques de indivídues negres roubarem, tentarem destruir e terem inveja dos seus "senhores", transformando es opressores nas próprias vítimas. Esse sentimento segue de forma bem similar até a atualidade, fazendo com que diversos descendentes de europeus tentem ignorar a questão do racismo e acreditem que, ao não falar sobre o problema, ele deixa de existir. Quando na verdade, é o exato oposto.

"O sujeito Negro torna-se então aquilo a que o sujeito branco não quer ser relacionado. Enquanto o sujeito Negro se transforma em inimigo intrusivo, o branco torna-se a vítima compassiva, ou seja, o opressor torna-se oprimido e o oprimido, o tirano", explica Kilomba em "A Máscara".

"Dia da Consciência Branca" é uma forma de apagamento histórico

O "Dia da Consciência Branca" é um paradoxo tão absurdo que seria cômico, se não fosse extremamente cruel e doloroso. Como podemos sequer comparar a história de duas raças diametralmente opostas e ignorar todas as consequências disso para a nossa sociedade hoje? Como fingir que não há uma super-representação de pessoas negras nas cadeias, favelas e em cargos de subserviência, enquanto há uma sobrerrepresentação desses mesmes indivídues em cargos de liderança, em posições sociais de destaque, nos dados de alta expectativa de vida?

Precisamos urgentemente entender que nossa história não é uma história verdadeira e incontestável. É uma história contada pelo lado dos opressores, por quem venceu a guerra. Então facilmente a apagamos. Precisamos entender que o branco não pode mais ser sinônimo de universalidade. Isso implica uma inclusão de diversidade em todos os âmbitos sociais. Precisamos aprender a ouvir pessoas negras e não a colocar todas as opiniões desses cidadãos nos ombros de uma única figura e adotar aquilo como verdade absoluta só porque é o que te agrada ouvir.

O Dia da Consciência Negra é sinal de resistência

Depois de tudo isso, a gente pode ter esperanças de um dia realmente achar desnecessário um Dia da Consciência Negra. Mas até o momento da sociedade vencer o racismo, essa data é sinal de resistência. E não vai ser a Regina Duarte, nem ninguém desse desgoverno que vai dizer que ela não é válida. É fácil rir da importância de um único mês para toda uma raça enquanto o faz do alto dos seus privilégios - que incluem não pesquisar o mínimo da História do Brasil e nem precisar ter competência para ocupar um cargo no Governo Federal. Difícil é topar entender, de fato, o país que vive e todas as dores que causa quando espalha desinformação e opiniões racistas e ignorantes dessa forma.